Saudade
Pai João
Era uma dessas noites claras, belíssima, quando, no firmamento, as estrelas desfilavam, faiscantes, encantando os olhos de quem as observasse.
A lua, exuberante, enfeitava ainda mais aquela longínqua paisagem, acariciando a Terra com sua luz prateada, apaziguando os corações, convidando-os a viajar nas asas do tempo.
Pensativo, com os braços apoiados no peitoril do alpendre de luxuosa residência, percorrendo com o olhar as inumeráveis nuanças daquela cena celestial, abraçado momentaneamente por indefinível melancolia, um abastado senhor fora levado a rememorar os tempos e a refletir sobre o seu hoje e o seu próximo amanhã.
Recordou-se então da sua saudosa infância, quando externava a pureza da sua alma, pela espontaneidade das suas palavras e da piedade incondicional do seu coração.
Seus pais o cercavam de todo o carinho, conforto e atenções, adornando os seus dias com suas amoráveis presenças.
Todas as noites, ao se deitar, sua mãezinha, pacientemente contava-lhe doces histórias sobre Jesus e, ao final delas, enaltecia os Seus ensinamentos e Sua incansável bondade, fazendo com que, aos poucos, do Cristo se enamorasse.
O tempo fora passando e, jovem ainda, enfrentou a maior das suas dores, quando os seus pais repentinamente partiram para o além, fazendo-o sentir-se inapelavelmente só, distante daqueles corações que tanto amava.
Inconformado, acossado pela revolta, deixou-se conduzir pelas mãos do mundo e, inebriado pelas suas ilusórias cores e efêmeros perfumes, fascinou-se, esquecendo-se do Sublime Peregrino do Amor.
Agraciado pela fortuna, caminhando pelas estradas da vida, conheceu incontáveis rincões e criaturas, desfrutou vitórias e amargurou derrotas, sorriu e chorou…
Desiludido com a vida e com as pessoas, naquele momento de profunda meditação, encontrava-se outra vez só, órfão do amor.
Foi quando então duas lágrimas incontidas deslizaram pelas suas faces, expondo as dores íntimas que visitavam o seu coração.
Naquele inesquecível instante uma voz silenciosa, percebida tão só pelos ouvidos da sua alma carente, dissera-lhe, plena de ternura: “Siga-Me, irmão querido, faça-Me companhia pelas veredas perfumosas do amor, pois, acredite, ainda há tempo!“
A partir daquele momento, uma alegria e uma paz indizíveis apossaram-se daquele homem, envolvendo-o completamente, fazendo-o sentir-se impelido a seguir os rastros do Cristo, espargindo o amor em direção a todas as criaturas que, doravante, viessem a cruzar os seus caminhos.
Foi então que tivera a certeza de que aquela profunda e inesperada melancolia que instantes atrás o havia, ternamente, abraçado, era tão somente, “saudade de Jesus”!